terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Além do portão

 Porta, porteira, portal, portão.  A expressão "Além do portão" poderia ser um poético pleonasmo, afinal todo portão deveria levar alguém a extrapolar seu universo. Ele, no entanto, fecha-se mais do que abre. Vive rodeado de medo tendo, como companhia, câmeras que vigiam e protegem. É um símbolo contraditório, pois pode levar ao mundo exterior, ou nos fechar em nossos próprios.

O portão é um controle, quem está dentro, é possível que saia, já quem está fora nem sempre consegue entrar.  É uma esperança de entrada, ou saída. A porta está para casa, como o portão para a rua. Porta leva a diferentes espaços interiores e exteriores, limitados pelo portão, que leva ao mundo, liberta dos limites impostos por um muro. “Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai, à porta do Ateneu”. Porta e portão reforçam mundos diferentes. Fora do portão há uma luta que se trava consigo mesmo. Há que se sair da zona de conforto, deixar a barra da saia da mãe, o aconchego da família. 

Bom seria uma sociedade sem muros e limitações. Porta sem chave, sem segredo. Portão assemelha-se a celas, grades, cárcere. Ficar para dentro do portão é emparedar-se, isolar-se, limitar-se a tanto metros quadrados que te separam de outros tantos metros quadrados. Às vezes um latifúndio, outras vezes um cubículo.

É preciso ir olhar, viver além do portão, não se monopolizar. A alteridade se constrói do portão para fora. Quem sabe um dia ele seja um objeto de museu: em um passado, muralhas e portais, muros e portões, em um futuro utópico, só um jardim florido unindo na diferença, um comum sendo compartilhado